"Dizem que ela tem talento, mas eu não sei. Anda às voltas dentro dela, é como um apartamento abandonado. Como uma casa em que os pais empurram os móveis para um canto, porque o filho dá uma festa. Para a pintura, dizem eles, e para os textos também. Criativa, mas silenciosa e estranha. E eu digo, vai lá percebê-la. Nada é claro. Por causa dela sinto-me culpado.
[...]
Ela está a olhar lá de cima da varanda. O céu. Grades e céu. Nada agudos os pensamentos dela. Tudo muito kitsch. Acabará por morrer, apesar de dizerem que tem talento. Vai chupar-me e morrer. Vai morrer e chupar-me. Em nome do livre arbítrio. Em nome do feminismo e da gravitação. E eu poderei unir as duas pontas com um brilhante golpe de teatro que realçará os meus dotes narrativos. E poderei não."
"O motorista de autocarro que queria ser Deus"
Etgar Keret
3 comments:
Peniche escreve-se com ch. Fim de citação.
Nos dias que correm deve ser mais Deus que quer ser motorista de autocarro do que outra coisa....
Gonçalo
Tenho que ir à Fnac ver este livro...
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